domingo, 18 de março de 2012

Concepção de Inclusão

As referências usualmente feitas de inclusão no campo da educação consideram as dimensões pedagógica e legal da prática educacional. Sem dúvida, dois campos importantes quando se pretende a efetivação destes ideais. No entanto, uma importante ampliação da discussão sobre os caminhos das políticas públicas para a inclusão escolar seria a consideração do contexto em que se pretende uma sociedade inclusiva.   As instituições educacionais, organizadas para estabelecer modelos de relações sociais, reproduzem com eficiência a lógica das sociedades. Trata-se de um lugar legitimado socialmente onde se produzem e reproduzem relações de saber-poder, como já teorizado por Foucault (1987). Nestas, a lógica das classificações sempre foi necessária para o estabelecimento da ordem e do progresso social. Daí pode advir a idéia de que a escola, como mais um equipamento de disciplinamento social, não foi concebida para ser inclusiva, mas para ser instrumento de seleção e capacitação dos “mais aptos” a uma boa conduta social. A efetivação de uma educação inclusiva neste contexto secular não é tarefa fácil. Não menos desprovida de dificuldades é a tarefa de um Estado que intenta organizar uma política pública que, como tal, se empenha na busca de um caráter de universalidade, garantindo acesso a todos os seus cidadãos às políticas que lhes cabem por direito. O campo da inclusão, entretanto, fundamenta-se na concepção de diferenças, algo da ordem da singularidade dos sujeitos que acessam esta mesma política. Como não torná-la, a cada passo, um novo instrumento de classificação, seleção, reduzindo os sujeitos a marcas mais ou menos identitárias de uma síndrome, defi ciência ou doença mental? Um possível recurso de que poderia se lançar mão neste sentido, seria o de uma lógica que oferecesse elementos de processualidade ao longo deste trajeto. Pelo simples fato de se tratar, não somente em discurso, mas na prática cotidiana, de uma rede de relações no trabalho educativo que estão instituídas há séculos e que se repetem como naturais e definitivas. É por dentro desta lógica que uma política macro quer se instaurar. Uma nova concepção de educação e sociedade se faz por vontade pública e é essencial que o sistema educacional assuma essa vontade. Para operar as transformações nos modos de relação dentro da escola é, também, necessário que os profi ssionais envolvidos tomem para si a tarefa de pensar estas questões de forma reflexiva e coletiva. Dito de outra forma, é necessário que todos os agentes institucionais percebam-se como gestores e técnicos da educação inclusiva. Nesta perspectiva, é essencial que o exercício social e profi ssional destes agentes esteja sustentado por uma rede de ações interdisciplinares, que se entrelacem no trabalho com as necessidades educacionais especiais dos alunos.  
 2. PROCESSO DE INCLUSÃO A investigação dos aspectos que necessitam evoluir na política de educação especial requer que se situe como este processo vem acontecendo efetivamente nas redes de ensino. Considerando que a inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais produz impasses no cotidiano escolar que exigem um constante repensar das práticas pedagógicas é importante a análise de alguns aspectos do contexto atual da inclusão no país. Os temas, delineados a partir de um mapeamento realizado em diferentes espaços educacionais, representam uma síntese dos principais aspectos percebidos como tensionadores do processo e emergiram da análise das opiniões dos diferentes segmentos da comunidade escolar envolvidos com a proposta de inclusão, as quais foram obtidas através de observações, de entrevistas semi-estruturadas, de grupos de discussão, bem como de diferentes experiências profi ssionais existentes. 2.1 Comunidade Escolar e a Política de Inclusão A associação mais imediata e comum no ambiente escolar, quando se trata de questionar posições acerca da política de educação inclusiva, é a de mais um encargo que o sistema educacional impõe aos professores. Mesmo sendo favoráveis à concepção contida na lei e percebendo os benefícios que sua implementação traria a toda a sociedade, o temor e as preocupações daí decorrentes são inevitáveis. Algumas expressões como: “a inclusão é forçada” ou “é inclusão só de fachada” sinalizam as dificuldades em lidar com o acesso de pessoas com necessidades educacionais especiais no ensino regular. As escolas, de modo geral, têm conhecimento da existência das leis acerca da inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais no ambiente escolar e da obrigatoriedade da garantia de vaga para estas. As equipes diretivas respeitam e garantem a entrada destes alunos, mostrando-se favoráveis à política de inclusão, mas apontam alguns entraves pelo fato de não haver a sustentação necessária,   como por exemplo, a ausência de definições mais estruturais acerca da educação especial e dos suportes necessários a sua implementação. Não raro ouve-se nas escolas referências a alunos com necessidades educacionais especiais como “os alunos da inclusão”, o que sugere o questionamento sobre o modo como são percebidos diante dos demais alunos. “Tenho vinte e cinco alunos, dois de inclusão”, comenta um professor. Além da evidente concepção de uma educação voltada para a “normalidade”, tal idéia contrapõe-¬se à compreensão da inclusão, largamente defendida na bibliografia, como um processo que deve abranger todas as diferenças. Outra evidência da fragilidade que ainda se encontra no entendimento do processo inclusivo diz respeito aos critérios utilizados na seleção e encaminhamento dos alunos com necessidades educacionais especiais. É senso comum nas escolas que todo “aluno com condições de aprendizagem formal” deve ser encaminhado para escola de ensino regular. No caso, os educadores consideram as escolas cicladas como as mais preparadas para receber estes alunos, já que o sistema por ciclos de formação possibilita o convívio com as diferenças e com colegas de sua idade. No entanto, ressaltam que algumas crianças e adolescentes não possuem condições de freqüentar a escola regular comum e, em alguns casos, nem a escola especial. Existe ainda, uma certa resistência em pensar a transformação do espaço da escola especial, pois muitos acreditam que sua estrutura também é inclusiva, promotora de laço social e que somente nela seria possível a permanência de algumas das pessoas com necessidades educacionais especiais. Porém, neste aspecto se evidencia uma contradição, enquanto a escola regular comum em cumprimento à legislação deve receber todo e qualquer aluno, a escola especial ainda mantém certos critérios de seleção, os quais permitem que não receba alguns casos com quadros psíquicos graves e/ou defi ciências múltiplas. Este é um importante paradoxo verificado no atual panorama da política de educação especial. Outra ressalva bastante proferida pelos grupos escutados é de que o processo da inclusão deve ser compartilhado com vários segmentos sociais, não ficando apenas ao encargo da escola, ou do professor, como pode se verificar nas seguintes expressões: “Sou a favor da inclusão, mas não jogando tudo no professor”; “Acredito na inclusão, mas estou decepcionada com esse ‘fazer de conta’ de que se está incluindo...”.   Neste sentido, torna-se especialmente relevante à participação dos diferentes segmentos na implantação dos direitos assegurados em lei para que os benefícios percebidos na política de inclusão educacional possam ser efetivados. Não há dúvida de que incluir pessoas com necessidades educacionais especiais na escola regular pressupõe uma grande reforma no sistema educacional que implica na fl exibilização ou adequação do currículo, com modificação das formas de ensinar, avaliar, trabalhar com grupos em sala de aula e a criação de estruturas físicas facilitadoras do ingresso e circulação de todas as pessoas. Em que pesem as inúmeras dificuldades presentes no cotidiano das escolas, permanece uma expectativa entre educadores e gestores escolares de que as transformações sociais alcancem a instituição educativa. O que está em discussão é qual a compreensão que temos da relação entre escola e sociedade. É pela educação que se transforma a sociedade, ou a escola é mera reprodutora das estruturas da sociedade? A concepção que tem orientado as opiniões de muitos gestores e educadores que atuam na perspectiva da educação inclusiva é de que a escola é um dos espaços de ação de transformação. Uma compreensão que aproxima a idéia de políticas de educação e políticas sociais amplas que garantam a melhoria da qualidade de vida da população. Consideradas essas questões, a educação inclusiva implica na implementação de políticas públicas, na compreensão da inclusão como processo que não se restringe à relação professor-aluno, mas que seja concebido como um princípio de educação para todos e valorização das diferenças, que envolve toda a comunidade escolar. (Ministério da Educação ,DOCUMENTO SUBSIDIÁRIO À POLÍTICA DE INCLUSÃO, Brasília – 2005, Secretaria de Educação Especial, Coordenação Geral de Articulação da Política de Inclusão. Autores: Simone Mainieri Paulon , Lia Beatriz de Lucca Freitas , Gerson Smiech Pinho)

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